Reforma do Imposto de Renda e Suas Implicações
A proposta de reforma do Imposto de Renda (IR) apresentada pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) promete aumentar a tributação sobre os mais ricos, contudo, uma análise realizada pelo Sindifisco Nacional sugere que esse grupo pode continuar a pagar taxas menores em comparação a setores da classe média. De acordo com os dados, profissionais como professores, bombeiros e policiais militares estão sujeitos a uma alíquota efetiva superior a 10% sobre sua renda. Isso indica que, mesmo com a reforma, os milionários poderão manter uma carga tributária inferior, devido a isenções que se aplicam a parte de suas receitas.
O levantamento, elaborado a pedido da BBC News Brasil, revelou que, caso a reforma seja aprovada, os milionários pagarão um imposto mínimo de 10%. Essa taxa é inferior à média que outras categorias profissionais enfrentam. Por exemplo, enquanto os milionários terão uma tributação reduzida, profissionais da educação e segurança pública já desembolsam, em média, 10% ou mais de suas rendas em IR. Essa situação evidencia uma lacuna na justiça tributária brasileira, levantando questões sobre a eficácia da proposta do governo em promover equidade fiscal.
Justiça Tributária e Proposta do Governo
Carolina Gonçalves, coordenadora de Justiça Social e Econômica da Oxfam Brasil, critica a proposta, apontando que o imposto mínimo de 10% é um passo em direção à justiça, mas ainda insuficiente quando comparado a padrões internacionais. No contexto global, apenas a Letônia e a Estônia, além do Brasil, isentam dividendos de tributação, o que reforça a necessidade de repensar a tributação sobre rendas de capital no país.
A proposta do governo prevê que os recursos gerados com o imposto mínimo serão direcionados para aumentar a isenção do IR para pessoas com rendimentos de até R$ 5 mil mensais e reduzir o imposto para quem recebe até R$ 7.350. Embora a reforma tenha obtido aprovação na Câmara dos Deputados, ainda precisa passar pelo Senado até dezembro para entrar em vigor no próximo ano. O governo acredita que essa medida servirá como um trunfo na campanha de reeleição de Lula.
Impacto sobre Diferentes Categorias de Renda
O novo modelo de tributação será progressivo, iniciando em zero para rendas mensais a partir de R$ 50 mil, e alcançando uma alíquota máxima de 10% para rendas superiores a R$ 100 mil. O ajuste anual do Imposto de Renda permitirá que aqueles que pagaram menos de 10% de sua renda, como um contribuinte com rendimento de R$ 2 milhões que pagou apenas 5%, completem essa diferença para que a alíquota efetiva atinja o mínimo exigido.
Estima-se que a reforma beneficiará cerca de 14 milhões de contribuintes e arrecadará recursos adicionais, impactando principalmente os milionários. Contudo, uma parte deste grupo, os grandes fazendeiros, poderá se isentar do novo imposto, uma vez que a proposta foi alterada na Câmara, permitindo que eles sejam tributados apenas sobre 20% de seus rendimentos, mantendo a maioria de seus ganhos isentos.
Disparidades na Tributação Entre Classes
Relatório do Sindifisco indica que enquanto as categorias de classe média e trabalhadores pagam taxas efetivas superiores a 10%, os milionários, por sua vez, têm alíquotas efetivas que diminuem. Em 2023, por exemplo, professores do ensino fundamental declararam uma renda média de R$ 104,7 mil, com uma carga tributária de 9,76%, enquanto produtores rurais com rendimentos de R$ 331,7 mil pagaram apenas 4,66% de alíquota efetiva. A discrepância na tributação reflete um sistema que, segundo especialistas, favorece os mais ricos.
De acordo com o economista Branko Milanovic, uma mudança na tributação pode, sim, afetar a distribuição de renda, mas os críticos argumentam que uma maior taxação poderia levar a uma fuga de capitais do país. Dados da Receita mostram que, apesar do aumento no número de milionários que deixaram o Brasil, a taxa de saída é inferior a 1% e vem decrescendo desde 2017, indicando que a ameaça de fuga pode não ser tão realista quanto muitos imaginam.
A Questão do Congelamento da Tabela do IR
A análise do Sindifisco também destaca que as categorias de classe média vêm enfrentando um aumento na carga tributária devido ao congelamento da tabela do Imposto de Renda, que sofre defasagem em relação à inflação. Enquanto isso, os milionários se beneficiaram da isenção sobre rendas de capital, como os dividendos. A situação atual é uma inversão em relação a 2007, quando a carga tributária era mais equilibrada entre as diferentes classes de rendimento.
Por fim, o presidente do Sindifisco, Dão Real, enfatiza que a reforma proposta é um passo importante, mas ainda insuficiente para corrigir as distorções existentes no sistema tributário. Ele sugere que um imposto mínimo mais elevado, de até 15%, poderia ser uma solução mais eficaz, mas reconhece as resistências que tal medida enfrentaria no atual cenário político.