Oportunidade na Diversificação Agrícola
Apesar dos avanços no conhecimento científico e dos resultados positivos observados em várias regiões do Brasil, as plantas de cobertura continuam sendo subutilizadas na agricultura do país. O pesquisador Fernando Mendes Lamas, da Embrapa Agropecuária Oeste, analisa esse fenômeno em um artigo que alerta para um dos principais desafios da produção agrícola nacional: a escassez de diversidade nos sistemas produtivos.
Segundo Lamas, a predominância de poucos modelos, como a sequência soja-milho ou algodão, especialmente na região central do Brasil, impacta diretamente a estabilidade da produção e eleva os custos para os agricultores. “O maior desafio da agricultura brasileira atualmente está ligado à falta de diversidade nos sistemas produtivos. Essa baixa variedade nos agroecossistemas é uma das causas da instabilidade da produção e do aumento das despesas de cultivo”, afirma o especialista.
A Embrapa e outras instituições têm demonstrado que a diversificação por meio das plantas de cobertura — também conhecidas como plantas de serviço — é essencial para promover a sustentabilidade na agricultura. Estudos realizados em regiões como o norte do Paraná evidenciam ganhos econômicos significativos com sistemas produtivos mais diversificados.
Potencial Não Aproveitado
Mesmo com alguma evolução na adoção de práticas diversificadas, a utilização dessas plantas ainda é bem inferior ao que poderia ser alcançado. “Embora tenha havido um crescimento modesto recentemente, a aplicação dessas plantas ainda está aquém do seu potencial para melhorar o ambiente de produção, resultando em maior produtividade e estabilidade, especialmente em anos com condições climáticas adversas. Portanto, aumentar a produção é importante, mas garantir sua estabilidade é fundamental”, ressalta Lamas.
A discussão sobre as plantas de cobertura é ampla e tem ganhado destaque na comunidade científica. De acordo com dados do Periódico Capes, entre 2020 e 2025, foram publicados 2.364 artigos no Brasil sobre o tema. “Isso levanta uma questão importante: temos conhecimento suficiente para incorporar as plantas de cobertura nos sistemas de produção de grãos, fibras e energia nos diferentes biomas do Brasil? A resposta é sim”, afirma o pesquisador.
Os benefícios das plantas de cobertura são amplamente documentados: elas oferecem proteção ao solo contra erosão, ajudam a manter a umidade, reduzem a temperatura da superfície, aumentam a matéria orgânica do solo, melhoram a infiltração da água, estimulam a atividade biológica, promovem a ciclagem de nutrientes, fixam nitrogênio e auxiliam no controle de plantas daninhas e nematoides. “Essas plantas são indispensáveis para quem busca uma agricultura conservacionista”, conclui Lamas.
Enfrentando a Compactação do Solo
Outro ponto abordado no artigo é a compactação do solo, um problema comum na agricultura moderna. O pesquisador aponta que, em muitos casos, a compactação é resultado do manejo inadequado e que a solução não deve se restringir a intervenções mecânicas. “A descompactação do solo deve integrar práticas vegetativas, como o uso de plantas de cobertura”, argumenta.
Quando manejadas adequadamente, as plantas de cobertura podem ajudar a prevenir e até resolver a compactação do solo ao longo do tempo. Além disso, espécies de cobertura podem contribuir para o manejo de plantas daninhas resistentes, como a buva, e para a melhoria da fertilidade do solo. Leguminosas, como a crotalária e o guandu, são capazes de fixar o nitrogênio atmosférico, enquanto forrageiras do gênero Urochloa podem ser integradas à pecuária, fortalecendo sistemas de integração lavoura-pecuária.
Por que a Adoção é Baixa?
Ao final de seu artigo, Lamas aponta duas razões principais para a baixa adesão às plantas de cobertura pela agricultura brasileira. “Temos conhecimento suficiente para tirar proveito dessas práticas. Então, quais são os motivos para sua escassa utilização pelos agricultores? Identificamos duas razões principais.”
A primeira é que os principais benefícios das plantas de cobertura costumam se manifestar a médio prazo, o que demanda uma visão sistêmica e planejamento que vão além de uma única safra. A segunda razão está relacionada à lógica de mercado. “Essas plantas não fazem parte de pacotes de sementes amplamente comercializados e, muitas vezes, não produzem itens que possam ser imediatamente vendidos”, explica.
Assim, o desafio não reside na falta de conhecimento, mas na dificuldade de implementar esse saber na prática nos sistemas produtivos. Em um contexto de mudanças climáticas, aumento dos custos e necessidade de maior resiliência, as plantas de cobertura surgem como uma ferramenta estratégica que ainda não foi plenamente explorada pela agricultura brasileira.
